quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O fascinante mundo dos sebos

Ah, os sebos, os sebos… como é maravilhoso o mundo dos sebos!. Nada contra as livrarias, com suas estantes repletas de livros tinindo de novos, muito pelo contrário. Fuçar nelas é sempre um programa muito divertido. O problema são os preços, invariavelmente proibitivos para o bolso de um estudante e para o salário da maioria das pessoas. De vez em quando, é possível ser surpreendido com uma boa promoção nas livrarias online. Mas mesmo essas não conseguem competir com os sebos. Vou mais longe: comprar em sebos é infinitamente mais charmoso do que comprar na mais refinada das megastores.
As razões não se restringem ao preço dos livros. Eles podem ser bem caros, em especial os mais raros. (Até rimou!) Mas existem muitas vantagens. Os sebos funcionam como uma espécie de “museu do mercado editorial brasileiro” onde é possível encontrar desde os mais novos lançamentos, até algumas obras que sairam de catálogo, nunca mais voltaram porém continuam importantes. Justamente por esse motivo, o novo acordo ortográfico, que comecará a entrar em vigor em janeiro de 2009, será letra morta nos sebos, pois estes abrigam todas as ortografias, de todos os tempos.
Até o fato dos livros serem usados, o que incomoda algumas pessoas, é fascinante para mim. Pode-se descobrir muito do espírito humano nos sinais deixados pelos antigos proprietários. Certa vez, um amigo comprou um livro de teoria da História. Comprou e não o folheou, uma atitude não muito aconselhável. Depois, já na faculdade, se espantou com o que encontrou: entre um conceito histórico e outro estava o que eu logo apelidei o “diário de uma suícida” Não lembro exatamente o conteúdo, mas sei que não era dos textos mais animados ou edificantes. Curiosamente, a autora usou os espaços vazios para descrever suas mazelas, respeitando o território do texto original.
Outra coisa muito divertida são os livros com dedicatórias, sejam dos próprios autores ou de ilustres desconhecidos. No primeiro caso, eu achei um exemplo curioso numa das minhas últimas incursões aos sebos. Na dedicatória, o autor escreveu para um amigo que eu não lembro o nome: “Fulano, obrigado por confiar em mim no início da minha carreira. Um abraço, Milton”. Pensei com os meus botões: “Talvez, ele não tenha confiado tanto assim…”. Já imaginaram a reação do escritor ao encontrar esse livro com sua dedicatória? Não deve ser muito agradável. Eu também já vi Playboys com autográfo na capa. Infelizmente, não era nenhuma famosa, mas uma dessas modelos obscuras que, vez ou outra, posam (ou seria pousam?) na revista. Se ainda fosse a Luma de Oliveira…
O bom dos sebos é que cada um tem a sua identidade própria. Alguns são mais careiros; outros são mais focados em promoções, tem aqueles dedicados a livros jurídicos (esses não me interessam), sebos grandes ou tão pequenos que você disputa lugar com os próprios livros. E atenção: não menospreze os sebos de bairro. É possível achar verdadeiras preciosidades com preços inacreditáveis. Os melhores negócios que fiz foram nesses lugares, minúsculos se comparados com os do centro de São Paulo. Um exemplo: certa vez, fuçando num sebo perto de casa, eu encontrei o clássico “A sangue frio”, do Truman Capote, por… 1 real! Quando comentei isso com um amigo, ele brincou: “Nesses sebos, você pode achar ‘A república’, do Platão, com dedicatória do autor e tudo, por uma merreca”
Por essas e por outras, não é muito recomendável ir em sebos com muita pressa; é necessário ter tempo para escarafunchar (que palavra, que palavra!) as estantes com calma e, principalmente, é preciso ter disposição para negociar, outra das grandes vantagens dos sebos. A maioria dos lugares que vou aceitam fazer um descontinho, alguns são mais generosos, outros tem um percentual fixo que é, de modo geral, 10% do valor final. Mas não deixe nunca de pechinchar. Se você for vender os livros, não vá em um único lugar. Ofereça em vários sebos. Um caso pessoal: certa vez, eu tinha acumulado alguns livros para vender. Fui, então, no centro da cidade. O primeiro sebo não se interessou por nenhum. O segundo também. O terceiro já me animou um pouco e ofereceu R$ 8, 00. Como tinha um quarto sebo perto, resolvi testar a minha sorte e me dei muito bem. Esse livreiro me ofereceu R$ 12, 00.
O leitor deve estar pensando que eu me contentei com uma ninharia, certo? Eu diria: sim e não. Sim, porque, obviamente, o oferecido foi uma merreca mesmo. Mas não é tão simples assim. Primeiro, porque os livros não eram grande coisa, aliás foi por isso mesmo que eu quis me livrar deles. Segundo, porque faz parte da estratégia dos sebos comprarem pelo mínimo possível e venderem pelo máximo que puderem. Você só conseguirá um bom valor se tiver algo muito raro, ou alguma obra muito atual ou que seja facilmente vendável. Caso contrário, não vai adiantar chorar muito, pois nesse ponto eles são bastante inflexíveis. Conselho-amigo: só troque os seus livros por dinheiro quando isso realmente valer a pena. Se o oferecido for pouco, prefira crédito na troca por outros livros e peça um pouco mais. De modo geral, eles aceitam. Mesmo com pouco crédito, é possível fazer um estrago considerável.
Um último caso pessoal para ilustrar. Na minha última ida aos sebos, eu tinha novamente acumulado alguns livros para vender. Como no episódio relatado acima, os primeiros foram pouco generosos nas suas ofertas e, mais uma vez, fui persistente. No último sebo da minha peregrinação, o dono oberva, rapidamente, e com pouco interesse, o que eu tinha para oferecer – afortunadamente, ele não reparou que um deles estava num estado periclitante.Sebo também é sorte. Ele, então, faz uma pergunta:
- Quanto você quer por eles?
Fiquei meio surpreso com a pergunta tanto que respondi com outra:
- Quanto você me oferece?
Ele olha novamente para os meus livros e dá o seu veredito:
- R$ 10, 00
Não gostei muito da oferta e pedi para pensar um pouco. Outro cliente também estava oferecendo os seus livros e também não estava satisfeito. O livreiro, então, diz:
- Se você trocar por dinheiro é R$ 10, 00, por crédito posso deixar por R$ 12, 00.
Não deixei passar batido:
- No meu caso também?
O homem concordou e eu fechei negócio. Com esse valor em mente, passo a vasculhar as estantes. Vou direto para a de jornalismo. Naquele dia, essa parte estava relativamente fraca; os livros ou eram caros demais ou desinteressantes demais. Mas a sorte sorriu e eu acabei pegando um, com uma coletânea de entrevistas, por R$ 8, 00. Juntei com outro, de charges, coisa que adoro, por R$ 3,00.
(Aqui, um parêntesis com uma dica. Existiam vários livros iguais de charge. O preço variava dependendo do estado da edição. Isso é algo bem comum em sebos: o mesmo livro ter preços diferentes, dependendo do estado do mesmo. Ás vezes, alguns riscos na página de rosto já tiram alguns reais do preço. É sempre recomendável comparar e inspecionar os livros antes de comprá-los. Se não estiver tão danificado, vale a pena economizar um pouco. Até porque, venhamos e convenhamos, quem quer livro novo que vá pra uma livraria!)
Voltemos para minha última ida aos sebos. Ainda me restava R$ 1,00. Como não estava disposto a deixar esse dinheiro com o livreiro, fui dar uma olhada na parte de livros promocionais. Não tinha nada que valesse a pena. Já estava disposto a pegar um gibi quando, perto dali, estava a estante dos livros de Agatha Christie, autora de romances policiais que gosto muito. O mais barato custava R$ 3,00, mas resolvi arriscar. Por mais sovina que fosse, gastaria apenas R$ 2,00. Fui até o caixa e perguntei se tinha algum problema que um dos livros tivesse ultrapassado o valor dos créditos. O senhor que me atendeu respondeu com certa ranzinzice:
-Problema tem, mas fazer o quê?
Ah, os sebos, os sebos…

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